Vitória do Syriza provoca inquietação contida na Alemanha


Governo sublinhou necessidade de respeitar compromissos. Mais contundente foi vice-presidente do grupo parlamentar da CDU: “Os gregos têm o direito de eleger quem querem. Nós temos o direito de interromper o financiamento.”

Talvez por já ser esperada, a vitória do Syriza motivou na classe política alemã manifestações de uma inquietação contida, que se traduziram, essencialmente, em sublinhar a necessidade de o novo Governo de Atenas respeitar os compromissos dos executivos anteriores.


“Para nós é importante que as medidas do novo Governo visem o prosseguimento da retoma económica da Grécia, o que implica que os compromissos assumidos sejam respeitados”, disse o porta-voz da chanceler, Angela Merkel.

Berlim proporá ao novo Governo grego “trabalho conjunto” e mantém a intenção de “estabilizar a zona euro”, afirmou Steffen Seibert, recusando comentar “os resultados de uma eleição soberana”.

A declaração do porta-voz será já uma jogada do “apaixonante jogo de póquer entre Merkel e [Alexis] Tsipras [líder do Syriza]”, previsto para os próximos tempos por Julian Rappold, analista do Conselho Alemão de Política Externa, depois de um triunfo do Syriza que “mina a política actual organizada sobre princípios alemães”, disse à AFP.

Com pequenas variantes, explicáveis pelo posicionamento partidário, sem novidade, a generalidade das reacções da área governamental não divergiram do tom dado pela chanceler.

Frank-Walter Steinmeier, social-democrata responsável pela pasta dos Negócios Estrangeiros, mostrou disponibilidade da Alemanha para “trabalhar com o Governo grego” mas disse esperar que Atenas “cumpra os acordos”.

Marianne Kothe, porta-voz do ministério das Finanças, liderado por Wolfgang Schäuble, membro dos democratas-cristãos de Merkel, a CDU, e firme defensor das políticas de austeridade, excluiu um cenário de perdão de dívida. Citada pela Reuters e pela AFP, admitiu apenas discussão ao nível europeu do prolongamento do programa de apoio financeiro à Grécia. O programa foi anteriormente prolongado, até ao fim de Fevereiro.

Pouco institucional, contundente, foi a reacção de Hans-Peter Friedrich, vice-presidente do grupo parlamentar da CDU. “Os gregos têm o direito de eleger quem querem. Nós temos o direito de interromper o financiamento”, disse ao diário popular Bild, o jornal mais lido da Alemanha.

O também democrata-cristão Manfred Weber, líder do PPE, grupo dos partidos conservadores no Parlamento Europeu, pronunciou-se na mesma linha. “Os contribuintes europeus não estarão dispostos a pagar pelas vãs promessas de Tsipras”, líder do Syriza – disse. “A Europa está preparada para ser solidária com a Grécia se os compromissos assumidos e os acordos forem plenamente respeitados.”

Martin Schulz, socialista que preside ao Parlamento Europeu, pensa que Tsipras “terá de encontrar compromissos com os parceiros europeus”, mas não deixou de marcar distâncias face ao partido que liderará a Grécia ao dizer que não pode “imaginar que os parceiros da UE subscrevam” as reivindicações “radicais” do Syriza. Bem diferente foi a reacção do partido alemão de esquerda radical Die Linke, que apelou “a uma Primavera vermelha europeia”.

No campo financeiro e empresarial as reacções não divergiram muito das adiantadas pelos políticos. Logo no domingo, no mais incisivo dos primeiros comentários, o presidente do Banco Central Alemão, Jens Weidmann, avisou o Syriza para “não fazer promessas ilusórias” e sublinhou que Atenas “continua a ser beneficiária de um programa de ajuda”, o que implica que “os compromissos devem ser respeitados”.

 Esta segunda-feira, Markus Kerber, líder da Federação Alemã da Indústria, declarou que a Grécia fez “progressos na via das reformas” e “seria catastrófico parar a meio caminho”. A opção proposta pelo sindicato alemão Verdi é outra: um “programa de investimento” para “reconstruir a Grécia”.

À excepção do Bild, para o qual os gregos elegeram “o pesadelo do euro” e Tsipras é “perigoso”, a imprensa reagiu de modo sereno e chamou a atenção para o contraste entre a “confiança” que foi dada pelo povo grego ao Syriza e o descrédito em que caíram os grandes partidos tradicionais.

O conservador Die Welt não acredita num “naufrágio da zona euro” e admite que a situação grega pode fazer do líder do Syriza “um reformador inesperado”. A revista de centro-esquerda Der Spiegel considera Tsipras, “suficientemente inteligente” para “procurar uma solução negociada” com os credores. No seu site, escreveu que é fácil traçar “um cenário de horror” após o escrutínio, mas entende que o último domingo poderá também ficar na história como “o dia em que os gregos tomaram o destino nas suas mãos”.

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