Só 838 mil utentes se registaram na Plataforma de Dados da Saúde
Meta para este ano era de dois milhões de utentes. Foi 40% cumprida. Presidente dos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde fala de limitações financeiras e de um projecto que teve de “descer à terra”.
O projecto prometia muito. O Governo da altura queria ter, até 2012, o chamado Registo de Saúde Electrónico, onde os profissionais de saúde poderiam consultar os principais dados clínicos de cada português, como alergias, medicação e internamentos, e a que cada cidadão também poderia aceder para inserir informação que considerasse relevante para o seu acompanhamento clínico. O que hoje existe é a Plataforma de Dados da Saúde, onde apenas se registaram 838 mil utentes. A expectativa era ter cerca de dois milhões durante este ano.
O chamado Registo de Saúde Electrónico era bastante mais ambicioso do que o que está no terreno, admite o presidente dos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS), Henrique Martins. Este projecto tecnológico, prometia-se em 2010, aumentaria a certeza nos diagnósticos e diminuiria o erro médico, traria ganhos de eficiência, evitando, por exemplo, a duplicação de exames que aconteciam por as unidades de saúde não comunicarem entre si.
Eram apenas algumas das virtudes de um projecto impulsionado no tempo da ministra da Saúde, Ana Jorge.
Esta semana, um relatório da Fundação Calouste Gulbenkian sobre as reformas necessárias na área, intitulado Um futuro para a saúde, diz que é essencial a “plena implementação” de “um registo de saúde electrónico universal”, constatando que no sistema que existe “os dados de um sistema não podem ser utilizados por outros [entre hospitais, por exemplo] e os que são necessários em situações de emergência não são acedidos por não estarem disponíveis em arquivo”.
Henrique Martins, que preside aos SPMS (empresa pública a quem cabe gerir várias valências tecnológicas do Serviço Nacional de Saúde) desde Abril do ano passado, diz que na altura em que começou a ser pensado o chamado Registo de Saúde Electrónico, a ideia era comprar um software de raiz, através de concurso público, a um grande fornecedor. Depois, “foi preciso descer à terra”.
“Mudou o Governo. Tecnicamente não tinha sido feito nada em 2011” e “não havia dinheiro para um projecto de grande envergadura”. Decidiu-se então “usar os software antigos, onde estão os dados dos utentes, criando um sistema mais barato”.
Ao mesmo tempo, a Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD) “não permitiu a criação de um depósito central de dados da saúde”, por considerar que tinha demasiados riscos de segurança. Assim, cada instituição (hospital, centro de saúde, etc) mantém os seus dados, mas o que pode ser acedido pelo profissional de saúde sobre cada doente depende muito de cada unidade.
“Há uma grande heterogeneidade, há hospitais que têm tudo em papel, há instituições com sistemas tão antigos que não podem mostrar os seus dados.”
Quando começou na tarefa, Henrique Martins lembra que os computadores tinham uma média de idade de nove anos, “não aguentavam um Registo de Saúde Electrónico”, muitos médicos nunca faziam notas de altas no software. Tentaram sensibilizar as direcções clínicas dos hospitais, havia 54% altas registadas informaticamente, agora serão à volta de 70%, estima.
Obstáculo tecnológico
Para criar a actual Plataforma de Dados da Saúde, que integra o Portal do Utente e o Portal do Profissional, o que se fez foi “um upgrade dos sistemas já existentes e tentou ligar-se os sistemas entre si”.
No final de 2012 arrancou a plataforma, no início apenas na área da Administração Regional de Saúde do Norte, depois a nível nacional. Mas “não há orçamento para divulgação”, diz. Estão a tentar conseguir verbas através de fundos europeus.
A ambição para este ano era ter dois milhões de cidadãos no Portal do Utente — até agora registaram-se pouco mais de 40%.
Trata-se de um registo voluntário, a que o profissional de saúde pode ter acesso através da plataforma, em que é a própria pessoa a informar, por exemplo, as suas doenças, alergias, a medicação que toma, o seu contacto de emergência — aquele que é actualmente um dos campos com maior taxa de preenchimentos — e pode lá ver o seu testamento vital, depois de validado.
Também pode fazer marcações de consultas de centros de saúde online: “Doze por cento dos utentes da Administração Regional de Saúde Lisboa e Vale do Tejo já usaram para a marcação de consultas nos centros de saúde. Não é um número mau”, comenta o responsável.
Mas quanto se trata de o cidadão aceder aos seus dados de saúde produzidos pelo próprio sistema de saúde (notas de alta, contactos com o INEM, idas ao centro de saúde, entre outros) isso é bastante mais difícil, admite.
Enquanto para o registo voluntário basta o número de utente do Sistema Nacional de Saúde e uma password, para o acesso a dados de saúde oficiais é preciso o pin de autenticação do cartão de cidadão e ter um leitor do cartão de cidadão.
Quantos portugueses o têm? “Meia dúzia”, ironiza Henrique Martins, embora esclareça que pode ser comprado por uns cinco euros em lojas de bairro. Mas o facto de existir este patamar de autenticação mais complexo explicará, em grande parte, o facto de haver apenas inscritos 838 mil utentes, diz. “Não é prático.”
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